2ª guerra mundial estourar, os movimentos nacionalistas de extrema direita tentavam se espalhar como uma reação às crises que assolavam o mundo.
Em 1925 os Fascistas Italianos desenvolveram uma ação para ampliar o alcance da ideologia de Mussolini: uma organização recreativa para os trabalhadores chamada Opera Nazionale Dopolavoro (OND), algo como “Obra Nacional depois do Trabalho”.
A OND supostamente buscava promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral da população, nos horários após o trabalho.
Essa ideia atravessou o oceano e veio dar as caras aqui no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, e em 1938, a recém criada LFESP (Liga de Futebol do Estado de São Paulo) convidou o Opera Nazionale Dopolavoro de São Paulo para disputar a Divisão Intermediária, equivalente à série A2 do Campeonato Paulista. Para a disputa, foram obrigados a mudar seu nome para Orgnização Nacional Desportiva (mantendo sua sigla OND).
Os fascistas brasileiros prometiam demonstrar suas proezas em campos paulistas, e assim, como dois times da nossa região também jogavam a divisão intermediária, Santo André (que na época fazia parte do município de São Bernardo, que englobava a área do que hoje é o grande ABC) receberia em campo o time dos fascistas.
Fico me perguntando se esse fato gerou algum tipo de repercussão entre a torcida local, formada em boa parte por operários, muitos deles imigrantes italianos simpáticos ao anarquismo e comunismo, que fizeram história na região com as primeiras greves, já em 1906 (essa em específico, na tecelagem Ypiranguinha, num local próximo ao que seria anos mais tarde o Estádio do Corinthians de Santo André).
O ABC vivia uma grande mistura de ideologias, com crescimento do Partido Comunista Brasileiro, além da reorganização da União Operária fazer surgir um novo sindicato.
Enfim, chega o esperado domingo, 9 de outubro de 1938 a capa da página de esportes do Correio Paulistano destacava o primeiro embate:
Os fachos chegaram em Santo André para a disputa da partida contra o Primeiro de Maio FC.
O local da partida era o Mítico Estádio da Rua Brás Cubas, e como sempre acontecia, ele provavelmente estava apinhado de torcedores naquele dia. Será que algum torcedor visitante esteve presente?
Em campo, um nome de peso para a política e para o esporte de Santo André: o goleiro Bruno José Daniel (que anos depois daria nome ao Estádio Municipal).
Essa é uma imagem do campo naquela época, que mostra de fato como era forte a presença da torcida local:
Presente nas arquibancadas, os anarquistas e comunistas da região empurraram os “flechas verdes“, ao ataque.
O Primeiro de Maio não apenas jogou como se impôs diante dos fascistas que sequer esboçaram reação.
O caldeirão da Brás Cubas ferveu por quatro vezes, terminando com a vitória arrasadora por 4×1. Fico imaginando a cena e pensando se gritos de “Não passarão!!!” teriam vindo das arquibancadas.
Os fascistas deixaram a cidade com a cabeça quente, prometendo vingança…
Se não existia a possibilidade de um novo jogo contra o Primeiro de Maio, os fascistas prometiam descontar sua raiva contra outra equipe operária: o Corinthians FC, o “Galo Preto da Vila Alzira”.
A partida estava marcada para o dia 13 de novembro, no Estádio do Corinthians, e se o Primeiro de Maio já levava torcida, o “Corintinha” era ainda mais imponente.
Veja a imagens da arquibancada local na época, em um derbi contra o Primeiro de Maio (time perfilado):
O time que enfrentou a Organização Nacional Desportiva:
E mais uma vez, estampada nos jornais, o desafio entre operários do ABC e os fascistas:
E, nessa nova visita… Mais uma vitória fazendo a alegria dos operários anarquistas e comunistas de Santo André!
O Corinthinhas venceu por 2×1, no dia 13/11 contribuindo com que os fascistas desistissem de se aventurar no futebol profissional de São Paulo e deixando claro que nem no futebol nem na política havia espaço para esse tipo de pensamento.
Tag: Estádio da Rua Brás Cubas
O Estádio da Rua Brás Cubas, a casa do Primeiro de Maio FC
Dando sequência aos estádios do ABC, vamos falar do extinto Estádio do Primeiro de Maio FC (já falamos sobre o time, clique aqui pra ler), também conhecido como o Estádio da Rua Brás Cubas, na cidade de Santo André.
Lembrando que o futebol do ABC tem outros times, estádios e histórias, caso queira conhecer mais, veja aqui o Mapa do Futebol no ABC, desenhado pelo Victor Nadal.
Pra falarmos do histórico Estádio da Rua Brás Cubas é preciso voltar à Santo André dos anos 20…
E pra isso, vamos contar com a ajuda do Grupo Santo André Ontem e Hoje, relembrando alguns visuais daquela época, como a “Venda da Menotta Domenica DellAntonia“, mãe de Pedro DellAntonia.
Outro importante ponto da época era Fabrica Kowarick, onde hoje fica o Assaí atacadista.
Aquele era um tempo de grandes esperanças. Tudo era novo, o futuro estava a ser escrito e se as indústrias começaram a se tornar a principal característica da região.
Logo, os operários encontraram no futebol uma das formas preferidas de diversão e a cidade de Santo André via surgir grandes times, entre eles o Primeiro de Maio FC. Para quem se interessar, vale a leitura do livro “História do Futebol em Santo André” (clique aqui e compre na Estante Virtual):
E em 1º de maio de 1923, o Primeiro de Maio FC inaugurava o seu estádio, na Rua Brás Cubas, a poucos passos de onde hoje está a Catedral do Carmo, na época ainda em construção.
Para maiores informações sobre o estádio e sobre o próprio time, recomendo outro livro: Os flechas Verdes (clique aqui e compre direto da estante virtual), escrito por Ademir Médici:
Para a inauguração, foi convidado o time do Paulistano, que na época era um baita time e foi muito legal em topar vir inaugurar o Estádio. Podiam ter pego mais leve no campo…. Venceram o jogo por sonoros 5×2. Essa é a foto do dia do jogo, do dois times juntos:
As poucas fotos que consegui resgatar do Estádio da Rua Brás Cubas vem do livro do Ademir Medici e mostram ao fundo um centro de Santo André ainda bem diferente do que conhecemos atualmente.
Poucas casas, no máximo uns sobrados. Os prédios ainda demorariam décadas até chegar a nossa cidade.
A foto abaixo, de 1939, quando foi disputada uma partida em apoio às vítimas do terremoto no Chile.
Além de ser usado pelo time principal, o campo também era usado em outros momentos pelos sócios do clube.
O Primeiro de Maio FC não só fez história no futebol como viu a história da nossa cidade acabar com a natureza e também com o seu campo.
O centro ficou muito “urbano” para conter um estádio, e o futebol acabou deixando de ser uma prioridade para o clube.
Mas a sede do Primeiro de Maio FC segue no centro da cidade, e pelo menos mantém na memória imagens como essas, que nunca…. nunca mais voltarão…
Enfim, com muita tristeza, num domingo, em 9 de junho de 1940, o Primeiro de Maio FC fez sua estreia no Campeonato Intermediário da Liga de Futebol do Estado de São Paulo, contra o time do Tramway da Cantareira FC (o “Estrada de Ferro Cantareira“).
O placar foi de festa! 5×2 para o Primeiro de Maio FC, para a festa da torcida, mas… Aquele ficaria marcado como o última ano do time no Estádio da Rua Brás Cubas… 17 anos de história que tiveram que dar lugar à expansão da cidade.
Ainda em 1940, em abril, já com a notícia certa da perda da área do estádio, o time recebeu o São Paulo e levou uma goleada de 8×0… Mas para não terminar a história no Estádio da Rua Brás Cubas de forma melancólica, o juvenil do Primeiro de Maio FC recebeu, em outubro, o Juventus da Mooca e deixou um 10×1 de presente. O campeonato daquele ano terminaria seria jogado no Estádio do Corinthians de Santo André.